Monday, July 04, 2005

Pensamentos Soltos VII

Não sendo eu um adepto de Fernando Pessoa, recorro a ele para expressar o que me vai na alma:

O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tetos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»

«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»

Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disso no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um Povo que quer o mar que é teu:
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!

1 Comments:

Blogger João Magriço said...

Obrigado pelo momento nostálgico de me lembrares um dos poemas preferidos do meu pai. Já não o ouvia há muito tempo.

July 10, 2005 4:32 AM  

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