Wednesday, November 02, 2005

Sobre extraterrestres

Há uns dias atrás estava a conversar com uma amiga minha que me dizia que estava muito espantada com a tendência que as pessoas tinham para assumir que, caso existisse vida no cosmos, ela teria de ser idêntica à nossa.
Encarava isto como sendo uma incapacidade nossa em perceber que pode haver mais vida e sobretudo formas de vida diferentes de nós.
A questão que discutimos foi a dificuldade que todos temos em aceitar o novo, aquilo que desconhecemos e como tentamos “humanizar” à luz daquilo que conhecemos o desconhecido.
A tendência não é nova, quem não se lembra das “Nossa Senhora” do século 13 esculpidas como damas de corte coroadas? E as “Nossa Senhora” Indo-Portuguesas esculpidas com traços orientais e com marcas das divindades locais? Ou porque não as “Nossa Senhora” esculpidas nos séculos 15 a 17 em África com traços africanos ou ainda as “Nossa Senhora” de marfim chinês com os célebres olhos “em bico”?
A verdade é que temos sempre tendência a imaginar o outro à nossa imagem e semelhança, desde humanizarmos as divindades e nisso a cultura Greco-Latina é um excelente exemplo, a pensarmos que o outro é “igual” a nós.
Não querendo levar este texto para as questões de racismo e xenofobia que ainda existem e que na minha opinião estão muito ligadas ao desconhecimento que existe de parte a parte da outra cultura e hábitos civilizacionais, faço uma derivação algo diferente.
E nas relações entre pessoas?
A verdade é que mesmo entre pessoas do mesmo país, da mesma cidade mas tão-somente de géneros diferentes já se cria uma incompreensão importante.
É verdade, regresso ao tema das relações interpessoais e mais precisamente às relações amorosas.
Temos sempre a tendência para esperar que o outro seja “como nós”, que perceba instintivamente o que se passa connosco, que entenda o que sentimos sem termos que proferir uma palavra, que goste efectivamente das mesmas coisas que nós gostamos, esquecendo-nos que temos todos pontos de partida diferentes, vivências diferentes, formas de raciocínio diferentes, formas de sentir diferentes.
Quantas não são as vezes em que levamos alguém a um sitio que para nós é espantoso, e que esperamos que para o outro também o seja e depois… Bem, depois é a desilusão porque afinal o outro não teve a mesma reacção que nós tivemos e até pode não achar que seja assim tão interessante aquele local ou aquele livro ou aquela peça de musica, teatro ou arte.
E quantas vezes não ficamos magoados quando a pessoa que para nós é especial e portanto devia entender que aquilo que lhe mostrámos é para nós importante, nos diz friamente: “Era isto?”
Não o disse por mal mas sim porque para ela não era tão importante ou tão “moving” mas antes de sermos capazes de perceber isto sentimos uma certa afronta como se aquela pessoa gostasse menos de nós ou fosse menos pessoa por não gostar exactamente das mesmas coisas que nós.
Mas e a ternura que alguém demonstra por estar ali, por ter tentado perceber porque é que algo era importante para nós e mesmo não gostando ou não sendo aquilo que mais a move, está lá, aparece, esforça-se por saber um pouco mais, tem a delicadeza de tentar gostar do mesmo que nós? A verdade é que também temos que tentar gostar daquilo que faz o outro transcender-se.
O gosto educa-se e mesmo tendo gostos diferentes isso não implica que não se possam educar de parte a parte e fazer desse espaço um espaço de encontro entre duas pessoas.
Regressando um pouco ao ponto de partida, a nossa tendência de esperar que o outro nos perceba tal qual somos é em muitas circunstâncias um peso importante porque não é expectável que isso aconteça sem mais.
Há alturas em que não queremos explicar, é assim porque sim, mas alturas há em que uma pequena conversa pode fazer milagres e evitar muitos mal entendidos.
Nem sempre percebemos o que nos querem dizer ou o que não nos querem dizer, procuramos significados que podem não fazer sentido ser procurados.
Escrevo isto a pensar em mim, neste sentido, procuro uma série de significados para uma série de acontecimentos e cada vez mais me convenço que não devem ser para eu perceber ou interpretar, foram o que foram, são o que são. As pessoas não têm obrigatoriamente que ter a mesma visão dos acontecimentos que eu tenho nem sequer as mesma expectativas e provavelmente o erro foi exactamente eu ter formado expectativas como todos nós fazemos, mas uns apontam para um patamar e outros de nós para outro distinto.
E enfim, este longo texto para dizer que talvez em parte tenha tentado ver algumas coisas à luz das minhas expectativas, da minha forma de pensar e de sentir.

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

A percepção que cada um de nós tem da vida depende maioritariamente da experiência que esta nos vai transmitindo ao longo dos tempos. Não existe uma explicação e muito menos um entendimento para tudo o que acontece. Sem termos de alterar as nossas pretençoes para a vida, ao procurarmos nos outros o que esperamos para nós, e ao lhes exigirmos o mesmo que exigimos a nós, ou mesmo mais, podemos estar a magoar quem nos é mais próximo.
É difícil aceitar o desconhecido. Incompreensão? Será que existe na realidade? Mais grave é não nos apercebermos do que está a acontecer, a não ser quando nós próprios já somos os prejudicados.
Extraterrestres?? Somos todos nós...e entre nós!

November 05, 2005 10:56 PM  

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