Que frase mais estúpida pensou ele para si mesmo.
Terminara apenas uma semana de conversas mas que o marcara profundamente.
O fim-de-semana demorou a passar mesmo com ele a refugiar-se no seu trabalho e nos seus cigarros.
Olhava para o telemóvel com impaciência, esperando que ela dissesse alguma coisa, estava permanentemente ligado à net para ver se ela aparecia.
Passou o fim-de-semana, passou a segunda-feira e foi só no fim de terça-feira que eles voltaram a falar.
Ele nunca lhe ligava para o telemóvel, esperava que ela o fizesse para que não houvesse problemas com o namorado, pelo que só lhe falava na net ou então trocavam sms.
Ela aparecera na net, a conversa começou tensa mas depois tornou-se leve, faziam planos para o futuro…
Nesta altura ela disse-lhe que estava cansada do outro e que queria mudar a vida dela. Ele sentiu um misto de alegria, medo, ansiedade e tristeza.
- “Gostas dele?”
- “Gosto, mas ele não fala comigo. Não se interessa pelas mesmas coisas que eu, faz um esforço por prestar atenção mas não se interessa. Nunca me pergunta como estou e acha que eu estarei sempre ali. Achas normal?”
- “Acho, habituou-se…”
- “Estás a defendê-lo? Tu não és nada assim!”
- “Pois não, mas já fui assim, isso custou-me a minha ex-namorada. A partir daí, aprendi a ser diferente, mas às vezes ainda faço os mesmos erros…”
Houve um longo período em que não trocaram mensagens e ele olhava desesperado para o ecrã do computador. A resposta veio e foi bastante dura e seca.
- “Estou cheia de dores de cabeça, vou-me deitar, dorme bem.”
Ela desligara sem lhe dar tempo para responder. Ele ficou magoado e sem perceber o que se passava. Decidiu afastar-se um tempo da Internet.
Na quinta-feira dessa semana foi convidado pelo amigo que tinha feito anos para um café. Ele foi, e não imaginava o que se ia passar…
Chegou ao café e lá estava ela. Cumprimentaram-se de forma fria e distante. Ele não se importou, percebeu que ela não queria levar suspeitas mas mesmo assim custou-lhe ser ignorado o tempo todo por ela. Foi conversando com o seu amigo e com mais umas quantas pessoas que estavam lá e que também tinham estado no jantar.
Nesse dia chegou a casa e ligou-se à net. Ela estava lá, à espera dele.
O msn começou logo a piscar.
- “Desculpa, fui muito fria contigo…”
- “Foste, mas não há mal.”
- “Gosto de ti”
Ele ficou paralisado, podia esperar muita coisa, mas aquilo não.
- “E o …”
- “Ou é ele ou és tu…”
- “Ainda gostas dele?”
- “+ ou -”
Ele inspirou fundo e sem hesitar escreveu:
“o que tu gostas em mim, é eu ser mais velho, o facto de eu te ouvir, saber frases de Jane Austen de cor, conhecer Thomas Mallory, ter lido Eco, Joice, Bronte, Yeats, Eça de Queirós…
gostas que eu goste de pintura, de termos estado nos mesmos sítios, e onde não estive e tu estiveste eu conheço…
sou a novidade do momento, mas a verdade é que tu não me conheces, só sabes aquilo que te digo via telemóvel ou via net, estivemos juntos duas vezes e sempre em ocasiões sociais, tu não sabes como sou na vida a dois
se acabares com o teu namorado, nós não vamos ficar logo juntos, vamos conhecer-nos mas só depois é que se passará alguma coisa, tens que ter tempo para que ele saia mesmo da tua vida
tu gostas dele, sentes-te só, mas a verdade é que não lhe dizes isso, apenas lhe dizes que estás cansada e que tens muito trabalho, ele não advinha, ele pelo que tu contas gosta de ti mas também está aflito com trabalho
a sério, gosto muito de ti, mas fala com ele, não faças como eu fiz e deites fora uma relação que já tem algum tempo e que segundo o que me contaste já passou por muito, fala com ele, arrisca, investe nele se achas que vale a pena
A resposta no ecrã demorou…
- “Ok”
Ela desligou a net.
Ele sentiu-se vazio e confuso.
Quereria mesmo que ela ficasse com o namorado? Não sabia, mas não queria que ela escolhesse precipitadamente. Ele não tinha o tempo que ela queria para ela, ele queria a companhia mas não queria à custa de uma possível infelicidade futura.
Foi-se deitar, estava exausto.
Quando se levantou, no dia seguinte, ligou o telemóvel e chegou uma mensagem dela. Ia passar o fim-de-semana fora com o namorado e ia ter uma conversa séria com ele.
Ele passou o fim-de-semana distraído com o trabalho, foi ao cinema sozinho, foi jogar futebol com os seus amigos de sempre dessas andanças.
Deu por si, nos balneários, a pensar que já tinha 34 anos e que estava só, ela tinha 26 e ele tinha-lhe dito para que reflectisse.
Não queria que ela acabasse como ele, só, com rotinas instaladas para não ter que pensar mas ao mesmo tempo sentia-se estúpido, estava a perder aquela oportunidade.
O fim-de-semana passou mais depressa do que ele esperaria. Na madrugada de domingo para segunda-feira ele estava na net a trabalhar quando ela apareceu no msn.
Ele esperou que ela lhe dissesse qualquer coisa, estava em pulgas mas não queria tomar a iniciativa, não queria que ela soubesse que ele estava assim tão interessado.
O tempo foi passando e ela não lhe dizia nada e ele estava a começar a desesperar até que surgiu o sinal de email recebido. Ao ver o sinal e ao ler que era ela que enviava, clicou imediatamente e sem hesitar clicou no icon dela do msn. Ela já não estava online.
O email apareceu no seu ecrã. O título era sugestivo – “Obrigado por aquilo que não se agradece”
Sentiu um baque e nem lhe apeteceu ler o restante email mas mesmo assim forçou-se a isso.
“Olá, como estás?
O fim-de-semana foi muito bom e muito importante. Tinhas razão, ele ama-me e eu a ele. Ele não tinha percebido que eu me sentia tão só e tão triste, achava que era o cansaço do trabalho.
Decidimos ficar juntos e tentar de novo, desta vez falando mais e sem tanto medo de dizermos o que pensamos.
Obrigado pelo teu conselho, és um homem como há poucos. Tenho um enorme carinho por ti. És uma pessoa muito especial.”
Ele sentiu um frio desprezo e uma dor que conhecia bem. Acendeu um cigarro, fumou um cigarro atrás do outro…
A partir daqui, sempre que a encontrava na net, ela dizia que estava cheia de pressa e que não podia falar. As conversas eram muito curtas e apenas para dizer olá e adeus.
Ele sabia que isto se podia passar, mas esperava que alguma amizade ficasse, afinal tinham partilhado muitas coisas nestas duas semanas.
Não ficara nada, tinha sido mais uma pessoa que tinha entrado para espreitar a sua vida mas que depois, se tinha ido embora.